Pedro Bassan é o correspondente da TV Globo em Lisboa. Nasceu numa cidade do interior do Estado brasileiro de São Paulo, tem 39 anos, é casado e tem dois filhos. Tirou Direito na Universidade de São Paulo e Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero. Antes de chegar a Portugal foi correspondente na China.
Como correspondente da TV Globo em Lisboa transmite a imagem de Portugal no Brasil. Sente essa responsabilidade?
Sim e não. A minha missão como repórter é explicar melhor o que acontece aqui para os brasileiros. Não tenho que me preocupar com a imagem de Portugal. Mas tenho a responsabilidade de passar uma imagem correta. E mais ainda tratando-se de Portugal. Temos no Brasil uma comunidade portuguesa imensa e há uma fatia de Portugal que está entranhada na História do Brasil. Por outro lado há barreiras e imagens feitas. É um caminho longo.
E desde que está em Portugal, 2009, a imagem que os brasileiros têm de Portugal tem mudado?
Espero que sim. Se houve uma mudança é gratificante para mim. Nos anos 90, quando começou uma vaga de investimentos de Portugal no Brasil, o povo brasileiro começou a conhecer um Portugal mais jovem, quebrando o estereotipo da "velhinha de preto". Isso foi desaparecendo e a tendência é que desapareça ainda mais. E agora há muitos profissionais altamente qualificados que estão a ir para o Brasil. Isso também destrói estereotipos.
O jornalismo que se faz no Brasil é diferente do que se pratica em Portugal?
Na televisão é muito diferente. No Brasil tudo é mais curto e mais rápido. Aqui o noticiário principal dura uma hora e meia, lá tem meia hora. Uma informação que aqui se dá num minuto e meio, no Brasil é dada em 30 segundos.
E é mais formal aqui?
É mais formal sim. Mas a sociedade aqui é mais formal e isso reflete-se no jornalismo também. No Brasil é seguida a escola americana e aqui segue-se mais a escola europeia.
Que ideia tem dos media portugueses?
Eu gosto muito do que se faz aqui. Os media portugueses são de qualidade e tem excelentes artigos de opinião. É o que mais leio, até porque a informação em si chega por muitas outras formas. Os jornais têm hoje em dia como função principal explicar melhor os factos. Tenho a noção que a sociedade portuguesa é muito bem informada e existe um bom nível de debates. Basta ir a uma bomba de gasolina ou a uma tasca, as pessoas têm conversas com um nível muito elevado sobre os assuntos. Isso foi uma das coisas que mais me impressionou quando cheguei a Portugal.
Referiu que em Portugal os noticiários têm cerca de uma hora e meia, algo quase inédito no mundo. O que pensa disso?
Acho que é um hábito que a sociedade portuguesa adquiriu. Talvez torne o jornalismo mais discursivo, onde se expõem mais as ideias, num meio como a televisão que não está muito acostumado com isso. Acaba por ter reportagens mais apegadas à palavra. Acho que o meio termo é o mais correto. Se for demasiado frenética também pode ser prejudicial.
Na semana passada passou uma reportagem sua na TV Globo sobre a gastronomia portuguesa, no programa Globo Repórter de quase uma hora. Esse tipo de reportagens são encomendadas?
Nesse caso foi de lá da Globo do Brasil. Eles encontraram um estudo da Universidade do Porto sobre a dieta atlântica, parecida com a dieta mediterrânica, que tem algumas particularidades. Foi esse o ponto de partida. No Brasil dá-se uma grande atenção à alimentação saudável e em Portugal há dietas tradicionais, mesmo que não se chamem dietas. Aqui há uma alimentação extremamente saudável.
Tem sido muito solicitado para fazer reportagens sobre a crise portuguesa e europeia?
Eu não não faço parte de um jornal económico, por isso para o público em geral o tema da crise já está repetitivo. É mais do mesmo. Ainda para mais no Brasil, que é uma realidade que se viveu até há pouco tempo. As pessoas sabem que tipo de limitações existem em tempos de crise. É um assunto que neste momento está um pouco adormecido.
Acha que um português recém licenciado em jornalismo tem alguma hipótese de trabalhar num órgão de comunicação social brasileiro?
Eu gostaria que sim. Mas o mercado do jornalismo é particularmente saturado, em qualquer parte do mundo, se bem que com prosperidade económica abrem-se portas em todos os setores. Eu gostaria que houvesse portugueses a trabalhar na comunicação social no Brasil.
O estereotipo de que os portugueses são tristes e os brasileiros são alegres é verdadeiro?
Confirma-se. Eu acho. Tenho um amigo português disse-me uma coisa que eu acho brilhante: "o brasileiro é aquele que está sempre de braços abertos, mas nunca os fecha". O brasileiro às vezes também é demasiado alegre, tal como o português às vezes também é demasiado triste. Os portugueses queixam-se muito de Portugal. Os brasileiros que vêm para cá dão mais valor a Portugal do que os próprios portugueses.
O que pensa do Acordo Ortográfico?
O Acordo tem um quê de artificialismo... Mas aqui em Portugal há uma ideia generalizada que o Acordo é uma imposição do Brasil sobre os outros países de língua portuguesa. Mas no Brasil também se incomodam com as palavras que mudaram lá, se bem que há menos palavras que mudam.
Acha que o português europeu nunca será totalmente entendido e que vai ser sempre necessário o recurso a legendas, como aconteceu com a sua última reportagem feita em Portugal?
Mas essa foi a única reportagem que eu fiz com legendas, porque era longa. É um território cinzento. Estamos a tentar saber onde o brasileiro entende o português daqui e onde não entende. Todas as outras reportagens mais curtas que eu fiz não houve legendas. Os entrevistados que vão ao Jô Soares não têm legendas, os atores portugueses das novelas da TV Globo também não e têm muito sucesso... não sei... é caso a caso.
Ainda sente dificuldades em entender o português europeu?
Às vezes sim. Sobretudo ao telefone, por vezes não entendo nada. Mas depende da forma como cada pessoa fala e não por causa do vocabulário. Por exemplo Carlos do Carmo, fala mais claro do que muitos brasileiros...
O que pensou quando soube que vinha para Lisboa?
Eu ouvi dizer que a TV Globo ia abrir uma delegação aqui e candidatei-me imediatamente. Vim direto da China para Portugal. Foi como chegar a casa. Adoro Portugal, já conhecia, por períodos curtos. Fiz aqui muitos amigos portugueses, a maioria jornalistas.
Que reportagens tenciona fazer nos próximos tempos?
Talvez sobre a questão do fim dos feriados, muitos deles são os mesmos e o Brasil também tem muitos. Se alguma medida for tomada em Portugal vai gerar um debate lá nesse sentido. Aliás, vários temas que são debate aqui depois são debatidos no Brasil também.
Entrevista retirada do jornal Diário de Notícias
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